A relação entre música e videogames evoluiu significativamente ao longo das décadas. Vimos a chamada “gaming music” tornar-se uma força cultural capaz de moldar o consumo de gerações de fãs de música – abrindo espaço para a (re)descoberta de diferentes gêneros e artistas.
A música nos videogames é fundamental para a criação da atmosfera ideal para acompanhar e otimizar a jogabilidade. As trilhas sonoras são cuidadosamente compostas para intensificar momentos de tensão, euforia, e até mesmo tristeza, fazendo a experiência do jogador ainda mais imersiva e emocionalmente envolvente.
Para começar bem, aqui vai uma playlist com as faixas perfeita para jogar:
Isso acontece porque a música tem o poder de evocar emoções profundas, conectando os jogadores aos personagens e à narrativa de uma forma que transcende o simples ato de jogar.
A música nos jogos torna-se, assim, uma extensão do enredo e da jogabilidade. Capaz de reforçar a conexão emocional entre o jogador e o universo do game.
Mas afinal, por que a música é tão importante nos jogos?
O termo “gamer” – criado inicialmente para se referir às pessoas que jogavam RPG de mesa, com o tempo passou a se aplicar também a todos as modalidades de jogos de console e online.
Independente de ser um gamer casual ou hardcore, que busca ativamente novidades e dedica mais horas para os jogos – ambos conectam interesses que completam sua experiência.
De acordo com a Pesquisa Game Brasil 2024, mais de 70% dos jogadores afirmam escutar música com frequência enquanto jogam. Desses, mais de 60% tem costume de acessar o Spotify nesse mesmo contexto.
Considerando o impacto das plataformas de streaming de música no consumo atual, essas se tornaram essenciais para criar a trilha sonora pensada para os gamers.
Não à toa, o Spotify firmou parceria com a Sony, permitindo instalar o aplicativo no console Playstation. Além disso, associou-se também ao Xbox Brasil em 2020 – concedendo gratuitamente aos assinantes do Xbox Game Pass Ultimate três meses de acesso ao Spotify Premium.
Gaming Music: A trilha sonora pensada na jogabilidade
Apesar das semelhanças entre as músicas em videogames e filmes – como as trilhas de personagens ou nos créditos, por exemplo – o caráter não linear, e principalmente participativo dos jogos nos afeta de maneira singular.
Enquanto jogamos, embora a narrativa seja pré-definida, o poder das decisões e do protagonismo é nosso. Esse aspecto que nos permite interagir com a experiência é parte da justificativa do efeito tão singular da gaming music – cada vez mais estudado na academia. Muitas vezes, contemplado na chamada “ludomusicologia“.
A pesquisa The Role of Music in Videogames – destaca a multifuncionalidade das trilhas sonoras de jogos e evidencia que “aumentam a sensação de imersão, oferecem deixas para mudanças de narrativa ou enredo, agem como um significante emocional, aumentam o senso de continuidade estética e cultivam a unidade temática de um videogame“.
A criação de música para videogames se tornou uma parte importante da própria indústria musical, com compositores dedicados e trilhas sonoras de jogos sendo vendidas como álbuns independentes.
Jogos como “The Last of Us“, desenvolvido pelo estúdio Naughty Dog e “Red Dead Redemption” – publicado pela Rockstar Games, exemplificam bem o poder das trilhas sonoras para criar experiências imersivas e elevar a narrativa.
Em The Last of Us, a trilha sonora composta pelo argentino Gustavo Santaolalla utiliza melodias sutis e emotivas que capturam a desolação e a esperança em um mundo pós-apocalíptico.
Santaolalla, conhecido por sua abordagem minimalista na composição, buscou construir a trilha a partir dos personagens e aspectos emocionais da narrativa, fugindo de aspectos assustadores e mantendo a música mais comovente.
O empenho rendeu inúmeras indicações de premiações do gênero para a trilha sonora do jogo. Diversas faixas passaram a ganhar versões cover, performances ao vivo e tornaram-se cada vez mais populares entre o público. Em 2023, o game tornou-se uma série de TV da HBO (atual Max) com Gustavo Santaolalla assinando novamente a trilha ao lado de David Fleming.
Já em Red Dead Redemption, a música também complementa perfeitamente o vasto e selvagem cenário de Velho Oeste, tornando as jornadas do jogador ainda mais épicas e desafiadoras.
A trilha sonora do primeiro jogo (2018) foi composta por Bill Elm e Woody Jackson, com forte influência do Spaghetti Western – subgênero dos filmes de faroeste americano. No título a música captura perfeitamente a solidão do deserto, utilizando guitarras, violinos, e instrumentos tradicionais para criar uma sensação de vastidão e nostalgia.
Com a trilha novamente assinada por Woody Jackson, o lançamento de Red Dead Redemption 2 trouxe, desta vez, uma abordagem mais dinâmica e diversificada. Incluindo, contribuições de nomes como D’Angelo, Willie Nelson e Josh Homme. A música do RD2 busca refletir melhor a complexidade da narrativa e dos personagens, acompanhando o crescimento e os conflitos do protagonista.
No livro Game Sound a autora Karen Collins explica que o jogador não é um ouvinte passivo. Exatamente no sentido contrário, ela evidencia a prática recorrente de acionar ativamente a música no jogo, tornando possível também reagir subconscientemente a ela.
Isso seria possível pois a indução de humor e as respostas fisiológicas tendem a ser mais intensas quando o jogo apresenta maiores riscos – como ao ouvir uma música caótica e acelerada.
Retomando assim, o papel central da música em controlar as emoções do jogador e guiar suas reações ao jogo.
O silêncio também é descrito como fator significativo para aumento da tensão e/ou para sinalizar inatividade do jogador. Esse fade musical seria um “interruptor do tédio” para nos motivar a concluir a tarefa e seguir jogando.
A imersão proporcionada pelos jogos é intensificada pela música, que não apenas complementa as ações do jogador, mas também define o ritmo e a intensidade da experiência.
Em jogos de terror, por exemplo, a trilha sonora pode ser responsável por criar um ambiente de tensão crescente. Enquanto em jogos de aventura, as melodias épicas acompanham as jornadas dos heróis, fazendo com que o jogador se sinta parte integral daquela narrativa.
Impacto cultural e oportunidades para artistas nos games
A música em videogames tem um impacto cultural significativo, influenciando outras formas de mídia e até mesmo contribuindo com a cultura popular.
As trilhas sonoras dos jogos já mostraram seu poder de transcender o meio e influenciar a música e o mercado do entretenimento ao longo dos anos. Com o crescente mercado de games, surgem oportunidades diversas para músicos.
Especialmente em gêneros como o rap/trap, com uma base de fãs jovem e engajada, os videogames se apresentam como uma plataforma poderosa para ampliar sua audiência.
Nos últimos anos tivemos grandes nomes como Travis Scott performando virtualmente no game “Fortnite“. A apresentação realizada em 2020 foi vista por pelo menos 14 milhões de fãs, e segundo a desenvolvedora Epic Games, foi vista por um total de 12,3 milhões de jogadores, diretamente dentro do jogo.
O também rapper e produtor musical norte-americano Dr. Dre já marcou seu nome no mundo dos games, produzindo conteúdo para The Contract, um DLC (Downloadable Content) para a versão online do icônico GTA (Grand Theft Auto). Além da trilha exclusiva, o próprio Dr. Dre também já deu as caras como personagem dentro do jogo.
Quando se trata de videogames, existem dois tipos que costumam frequentemente acertar em cheio nas trilhas sonoras: esportes e corridas (automobilismo, motociclismo, etc…). Este último tipo tem um histórico consistente de colaborações com a indústria musical para incrementar a jogabilidade.
Quando pensamos no momento que o jogador está correndo virtualmente em carros super empolgantes, uma trilha sonora que te coloca no clima para acelerar é uma parte essencial da experiência.
Combinar o tom da trilha sonora com a vibe do jogo é fundamental, assim como oferecer diversidade em termos de gêneros e contextos representados.
Nos jogos da franquia Midnight Club, a trilha sonora é diversificada e ajustada para diferentes momentos do jogo, refletindo a energia do ambiente das cidades. Durante as corridas, faixas como “Get Low” de Lil Jon & The East Side Boyz e “Lean Back” de Terror Squad trazem batidas intensas e ritmos acelerados que elevam a adrenalina.
Na garagem, onde os jogadores personalizam seus carros, o clima é mais relaxado com músicas como “How We Do” de The Game feat. 50 Cent ou “Going Crazy” da artista Jean Grae, possibilitam ao jogador focar na customização com uma vibe mais descontraída.
Parcerias entre games e artistas no Brasil
Aqui no Brasil, uma das primeiras grandes parcerias entre artistas e games foi entre o jogo NBA 2K16 e os artistas Emicida e o Rael – selecionados pela 2K Games para compor a trilha sonora como únicos brasileiros entre mais de 50 artistas na playlist do jogo.
Já o DJ Alok se tornou personagem no “Free Fire” em 2019, e também apresentou-se no campeonato mundial do game.
Nesse mesmo ano a Som Livre fez uma parceria com a Lockwood Publishing para transmitir o primeiro show virtual brasileiro de rap com o grupo Haikaiss no jogo “Avakin Life“.
A cantora Anitta chegou a colaborar com o jogo “Free Fire” em 2022, ao lançar o single “Tropa” (com Luck Muzik), marcando o primeiro videoclipe em parceria com um jogo, junto de seu personagem jogável.
O projeto destacou, sobretudo, a importância da profissionalização e compreensão sobre a relevância dos games no mercado do entretenimento.
“Os games, a influência e as novas gerações estão ditando o que é o entretenimento moderno e o artista precisa estar disposto a entender essas novas dinâmicas. (…) Hoje, em qualquer projeto que eu desenvolvo com marcas, o público gamer está presente na maioria das vezes e eu acho fundamental pensar cada vez mais nele.” – afirmou Anitta em entrevista para a Forbes Brasil.
Consumo e experiência musical dos jovens através dos games
Assim, a música nos videogames pode ser vista como um elemento central na ambientação do jogador, mas também uma importante porta de entrada para novas experiências musicais. Um exemplo disso é o impacto dos jogos na popularização recente da música clássica entre as novas gerações.
Títulos como “The Legend of Zelda” e “Final Fantasy” incorporam composições clássicas ou inspiradas nesse estilo, despertando o interesse dos jogadores mais jovens pelo gênero.
O resultado é uma nova geração de fãs de música clássica, influenciados pelas trilhas dos games, buscando mais sobre compositores e obras fora do ambiente dos jogos.
Uma pesquisa da Orquestra Filarmônica Real do Reino Unido constatou que mais jovens são expostos à música clássica hoje graças aos jogos do que em apresentações ao vivo.
A fusão de tecnologia avançada e conhecimento erudito criou mundos como os da franquia Assassin’s Creed, que funcionam como máquinas do tempo que permitem aos jogadores explorarem a Grécia Antiga.
Além de sua função estética, a música nos videogames também atua como um elemento de identidade cultural e social. Para muitos jogadores, as trilhas sonoras dos seus jogos favoritos passam a ser símbolos de suas próprias jornadas, vitórias, e momentos de superação.
Essas músicas, muitas vezes, ganham vida fora do ambiente dos jogos, seja em concertos sinfônicos dedicados a trilhas de videogames, seja em playlists pessoais que os jogadores levam consigo no dia a dia.
Há diversas oportunidades na mesa para se conectar com um público global. E como as marcas têm aproveitado esses passion points?
Música, Games e Marcas
A conexão entre música e videogames pode ser incorporada na estratégia utilizada por marcas de várias maneiras. Aproveitando assim, o poder da música de criar associações emocionais e engajamento com o público.
Assim como a música em videogames ajuda a criar uma identidade única para o jogo e imersão, marcas podem usar dessa conexão – desde que associada de forma coerente e autêntica para ressoar verdadeiramente com o público.
Muitas marcas já entenderam o potencial de associar-se com jogos utilizando a música para aumentar a visibilidade e promover experiências realmente memoráveis.
Em 2021 a McDonald’s inaugurou duas novas unidades nos games “Minecraft” e do “The Sims 4” com visual inspirado no restaurante Méqui 1000, localizado na Avenida Paulista na capital São Paulo.
De acordo com João Branco, CMO da marca na época, o projeto tinha como objetivo reforçar a relação do McDonald’s no Brasil com o público gamer.
Em 2023, a marca Listerine em parceria com a 3C Gaming convocou o rapper L7nnon para se apresentar em um show virtual dentro do popular jogo Fortnite.
O show atraiu milhares de pessoas e destacou como a integração de música e jogos pode criar eventos de grande impacto. Com isso, o alcance global do jogo foi fundamental para promover tanto a música quanto a marca, em uma experiência imersiva completa de entretenimento aos fãs.
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Atuamos do nível estratégico ao tático, pesquisando, planejando e mapeando desde cenas locais a tendências globais de música, a fim de oferecer insumos para ajudar as marcas a se posicionarem no território da música e definirem suas ações de marketing.
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